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quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Para entender o fascínio por Rubio

Rubio enfia o dedo na bola para que ela o obedeça. Funciona.

Podemos criticar quando há expectativas demais sobre um jovem atleta, mas às vezes não há como evitar. Como ignorar o Neymar jogando tudo o que joga com menos de 20 anos? Sabemos que ele é jovem, que não tem cabeça e que ainda pode melhorar muito ou empacar, como já empacaram tantos talentos promissores e precoces. Mas gostamos de futebol, queremos ver o próximo gênio, é difícil controlar a excitação e a empolgação.

No basquete não é diferente. O assunto mais comentado desse começo de temporada no Bola Presa e qualquer outro site de NBA no mundo é o novato Ricky Rubio. O armador espanhol tem nos encantado e não poupamos elogios para as primeiras 10 partidas do espanhol no Minnesota Timberwolves. Mas por que tanta babação de ovo, né? O que ele faz de tão especial além de dar passes lindos, curar o câncer e ajudar velhinhas a atravessar a rua?

O mundo ficou boquiaberto quando o armador espanhol levou a seleção de seu país ao título Europeu Sub-16 em 2006 com os seguintes números na final contra a Rússia: 51 pontos, 24 rebotes, 12 assistências, 7 roubos e uma bola de 3 do meio da quadra que levou o jogo para a prorrogação. Sim, Ricky Rubio fez tudo isso. Liderou o torneio em todos esses quesitos, registrou 3 triple-doubles ao longo da competição e um quadruple-double. Nesse mesmo ano ele já jogava entre os profissionais e no ano seguinte era o líder da ACB Espanhola em roubos de bola. Dois anos depois foi titular da sua Seleção Adulta na final Olímpica contra os EUA. E pior, jogou bem aquela partida. Tem como não criar expectativas enormes?

A comparação com o Neymar que fiz no começo tem também outra razão. Os dois começaram chamando a atenção não só pelo talento, mas pelas jogadas de efeito. O Rubio adolescente adorava um passe diferente, um enfeite que rendeu comparações (exageradas e precoces, como sempre) com o lendário Pete Maravich, cara que foi grande jogador mas ficou mais famoso por dar os passes mais malucos da história da NBA. Porém, assim como cobraram que Neymar aprendesse a chutar, ser objetivo e amadurecer, pediram o mesmo de Rubio. E para sobreviver no basquete europeu isso era essencial. Assim, Rubio, com míseros 18, 19 anos, era um armador cauteloso, cerebral e eficiente. Bem mais chato do que a gente esperava, mas conquistava seu espaço.

Aí de repente ele empacou. Desde que foi draftado em 2009, quando decidiu ficar na Espanha por mais algum tempo, pareceu não evoluir mais. Virou, com razão, coadjuvante no Barcelona e na seleção espanhola. Era difícil explicar sem teorias inventadas como "Deve ser algo na vida pessoal" ou "Ele sentiu a pressão e a expectativa". Sei lá, mas estava mal e burocrático demais nas suas últimas temporadas europeias.

Mas como uma boa palestra motivacional que é a vida, isso parece ter feito bem para o Rubio. Em entrevista ao Adrian Wojnarowski do Yahoo!, Rubio disse que foi uma temporada em que "o jogo me testou e eu precisava disso". E, falando sobre seus vídeos na adolescência, o jovem adulto falou com certa nostalgia: "Eu vejo aquele jogador e ele não parece se incomodar com o que os outros dizem. Não se importa com o que vai acontecer caso cometa um erro. Naqueles jogos de quando eu era jovem pareço não me importar com nada". 

E as coisas pareciam não melhorar com ele indo para a NBA. Ao contrário de Luis Scola, Pau Gasol, Dirk Nowitzki ou, indo mais para trás, Vlade Divac e até jogadores mais consagrados como Arvydas Sabonis, nenhum outro europeu chegou na NBA com tanta expectativa. Nem Andrew Bogut e Andrea Bargnani, que foram escolhas 1 de Draft, tiveram tanta mídia em cima quanto Rubio. O único gringo de atenção comparável antes de sua estreia foi Yao Ming, e sabemos como ele sofreu com a pressão no seu começo de vida nos EUA.

O curioso é que acabou sendo o oposto. Ricky Rubio também sentia muita pressão na Europa, até demais. E segundo ele na mesma entrevista já citada, o tempo que ele passou treinando na Califórnia durante o locaute foi essencial para que ele se transformasse. Lá ele pode treinar sozinho, sem outros assistindo e julgando, poderia errar, arriscar, relaxar e voltar a ser o Rubio adolescente. Também aproveitou o locaute para treinar com outros jogadores da NBA (a matéria cita Kevin Garnett, Paul Pierce, Derek Fisher e Chauncey Billups) e ganhar tranquilidade e confiança para essa nova fase da carreira.

O que vimos até agora nesses primeiros jogos é muito mais o Rubio de 17 anos do que o do ano passado. A apreciação que a NBA dá a quem joga bonito, o incentivo para que se arrisque, é justamente o que ele precisava. Na Europa (e no Brasil, diga-se de passagem) as jogadinhas bonitas recebem aplausos quando dão certo, claro, mas é uma frescura, não um recurso, e os técnicos pegam no pé de quem se arrisca demais. Claro que na NBA as coisas precisam dar resultado e os técnicos cobram vitória, mas uma enterrada ou ponte aérea que não dê certo não é motivo de bronca ou punição. E quando dá certo vira notícia, vídeo mais visto do YouTube e os companheiros de time te amam e te respeitam mais.

O Ricky Rubio estava com vontade de mudar e não foi só para um liga onde a mudança seria mais aceita, mas para o time que buscava isso. Contei esse causo no nosso último Podcast, mas repito aqui. O David Kahn, criticadíssimo General Manager do Wolves, disse que uma das coisas que ele busca é fazer da franquia um lugar onde os jogadores queiram ir. Ele sabe que o time não tem tradição, fama e nem fica em uma cidade onde todos querem viver. Então para compensar eles querem tratar bem os jogadores, ter um ambiente agradável de trabalho e ter um estilo de jogo que os atletas sintam prazer em atuar. Por isso que eles trocaram o Jonny Flynn, que ficaria sem espaço no time e precisava jogar. Por isso contrataram o Rick Adelman como técnico também. O experiente treinador sabe lidar com jovens e sempre dirigiu os times mais velozes, criativos e ofensivos da NBA.

A entrevista completa em que o David Kahn explica isso é justamente para um de seus maiores críticos, o Bill Simmons da ESPN, e vale a pena ser ouvida. Lá ele também comenta sobre o Rubio e de como não se assustava com ele jogando mal na Europa, que uma má fase era normal para um garoto tão jovem. A aposta deu muito certo. O Wolves voltou a aparecer positivamente na mídia, o time joga bonito, com velocidade e não é difícil imaginar Free Agents cogitando ir para lá para poder atuar sob o Rick Adelman, jogar ao lado do Kevin Love e parecer bom por receber passes de Ricky Rubio. Assim como Channing Frye e Jared Dudley devem seus contratos a Steve Nash, e Kenyon Martin e Richard Jefferson sua fama a Jason Kidd, Rubio vai fazer uns companheiros milionários também.

Entender como os três, Adelman, Love e Rubio, se encaixam é essencial para explicar esse sucesso. Rick Adelman incentiva seus times a correr. Logo após o rebote (do Love, claro) já é possível ver Rubio batendo palmas para receber logo a bola e partindo em velocidade para o ataque. Lá ele encontra jogadores que podem se posicionar em qualquer lugar da quadra: Wayne Ellington, Michael Beasley, Derrick Williams e até Anthony Tolliver, todos, são velozes, sabem infiltrar e tem um arremesso de longa distância. Eles podem se espalhar pela quadra e só esperar que a visão de jogo do Rubio faça o resto. Ou melhor, quase todo o resto. Depois de enxergar é preciso que o passe chegue na medida e nisso Rubio é excepcional. Poucos na NBA, só caras do nível de Steve Nash e Rajon Rondo, conseguem dar passes com uma só mão, na corrida, com a mesma precisão de Rubio. E falo isso sem exagero, por observação pura.

A habilidade de passar a bola assim deixa o time mais rápido. Ele só precisa ver para quem quer passar e um segundo depois a bola está lá, um armador mais comum precisa diminuir a velocidade, colocar as duas mãos na bola e se esforçar para fazer o passe chegar na altura certa.

Outros detalhes fazem Rubio chamar tanta atenção, e isso temos que creditar a seus anos de rigidez na Europa. Ele tem paciência. Quer correr, é incentivado a correr, mas para no meio do caminho se não existe boa oportunidade. Sua paciência também tem dado resultado na outra jogada essencial do Rick Adelman, os intermináveis pick-and-rolls. Por entender bem o jogo, sabe reconhecer quando não passar para o Darko Milicic se o garrafão está congestionado, ou passa a bola do outro lado da quadra se a defesa adversária se fechou toda para evitar a jogada. Também sabe usar bem o pick-and-pop com o Kevin Love e o espaço no garrafão que essa jogada abre. E, pasmem, até está fazendo a defesa pagar quando não o defendem na jogada, indo por baixo do bloqueio. Se o deixam livre ele chuta mesmo de 3 pontos e tem 50% de aproveitamento na temporada.

Outra coisa muito Steve Nash (um dos maiores elogios que um armador pode receber) do Rubio é que ele não desiste do drible por qualquer coisa. Isso, junto com a ótima visão de jogo, são essenciais para que os times sempre pensem mil vezes antes de tentar pressionar ou dobrar a marcação sobre ele. E aí acontece o mesmo que com Rajon Rondo: quanto mais espaço dão, mais passes incríveis ele acha.

Os arremessos, que todos achavam que ele não acertaria, já vimos que estão caindo. Outra coisa que achavam que ele não saberia fazer bem é defender, mas até agora ele tem se saído bem. Nada fora de série, não anula ninguém, mas já enfrentou gente de alto nível, mais forte e mais rápida, e ele se garantiu. Curioso que isso se explica porque ele entende o jogo e sabe se posicionar. E pensem bem, compensar deficiências técnicas ou físicas com entendimento de jogo não é o tipo de comentário que fazemos para caras com 35 anos e uma vida de experiência na NBA? O NBA Playbook fez uma análise tática completa dos primeiros jogos do Rubio e postou um vídeo rápido de jogadas em que ele defende o Russell Westbrook e o Brandon Jennings. Não se sai nada mal.

Ricky Rubio não é perfeito, mas merece todos os elogios que recebeu até agora e em breve deve curar o câncer.

terça-feira, 29 de março de 2011

Vencendo sem querer

Leandro e Leonardo


Depois de muito tempo, finalmente o Leste é capaz de nos dar água na boca. Alguns dos melhores times da NBA estão lá, muitas estrelas foram trocadas para equipes do Leste, três equipes da conferência possuem mais de 50 vitórias e é completamente plausível (pra não dizer provável) que uma delas leve o título da NBA esse ano. Os playoffs no Leste serão incríveis, como será que o Celtics se sairá sem Perkins, como o trio do Heat reagirá à pressão, será que o Derrick Rose segura a onda, ainda dá tempo do Magic se acostumar com a mudança do elenco? Mas não podemos esquecer que essa empolgação com o Leste esconde uma verdade terrível: a conferência ainda fede.

Knicks e Indiana, atualmente donos das últimas duas vagas para os playoffs, possuem mais derrotas do que vitórias. O Sixers provavelmente manterá a sexta vaga apenas igualando o número de vitórias e derrotas. O Bobcats, que é um time que simplesmente desistiu da vida e quer se reconstruir (assumidamente nos moldes do Thunder), periga conseguir uma vaga nos playoffs mesmo tendo 10 derrotas a mais do que vitórias, chegou ao ponto deles pensarem em colocar o Stephen Jackson de molho no banco pro resto da temporada porque senão vão se classificar sem querer e ficar em pior situação ainda no draft. Isso significa que a elite do Leste (Bulls, Heat e Celtics) enfrentará um trio de cachorros semi-mortos em lavadas relativamente fáceis. Eu sei que ontem mesmo o Pacers ganhou do Celtics, e que o Sixers venceu o Bulls, e que eu não me arrisco a tentar entender o Sixers porque o time não faz sentido, mas eu duvido que numa série de playoff essas zebras se mantenham. Acho que o único confronto minimamente interessante deverá ser entre Hawks e Magic. Mas mesmo o Hawks, com 10 vitórias a mais do que derrotas,  é um time implodindo diante dos nossos olhos e vai tomar uma surra. Vão dizer: "ah, o Hawks é bom, o elenco é sólido, não venceram mais de 40 jogos a troco de nada". Pois é, foi o que todo mundo me respondeu quando eu avisei que o único jeito do Hawks vencer o Magic nos playoffs passados era o Dwight Howard comer veneno de rato ou tomar banho de banheira ao lado de uma torradeira elétrica. Como esperado, foi uma das maiores surras da história e vamos ter algo mais ou menos parecido outra vez. Então o Leste é legal, pode aparecer uma zebra ou outra por aí, mas a elite está muito acima dos reles mortais que se classificam com mais derrotas do que vitórias. A conferência ficou mais forte, é verdade, mas foi para alguns poucos. No fundo, acabou ficando ainda mais desequilibrada.

Enquanto isso, na conferência Oeste (que é tãaaaaao ano passado, querida!), três equipes podem terminar a temporada com mais vitórias do que derrotas e mesmo assim estarão fora dos playoffs. As três últimas vagas (atualmente de Blazers, Hornets e Grizzlies) serão disputadas por 6 times (com Rockets, Suns e Jazz com chances de classificação). É um absurdo! E prova de que equipes desacreditadas, em reconstrução, mais perdidas do que cego em tiroteio, conseguiram campanhas fenomenais - e históricas, até - enquanto ninguém estava olhando. Com mais ou menos uns 10 jogos sobrando para cada equipe até o fim da temporada, apenas dois jogos separam o sexto colocado Blazers do oitavo colocado Grizzlies, e mais dois jogos separam o Grizzlies do Houston, também separado por dois jogos do Suns. Ou seja, vamos dar uma olhada nas chances de classificação do Houston e do Suns e aproveitar para ver como suas campanhas deram milagrosamente certo num momento em que os dois times já pensavam em desistir e começar de novo.


Houston Rockets

O Houston começou a temporada acreditando que iria contar com Yao Ming, apostando na armação do Aaron Brooks e seu recém-ganho prêmio de Jogador que Mais Evoluiu, e com Shane Battier defendendo o perímetro. Terminou com um pivô de 1,98m chamado Chuck Hayes fazendo triple-double, a armação entregue ao eterno reserva Kyle Lowry (também fazendo triple-double), e a defesa de perímetro nas mãos do segundo-anista e ex-jogador de vôlei Chase Budinger, ou seja, foda-se a defesa de perímetro. O que diabos aconteceu? É tipo ir dormir com a Mari BBB e acordar com a Mari Alexandre: tá tudo bem, ninguém vai reclamar de nada, mas não era exatamente o que estava nos planos.

O começo capenga e a milionésima lesão do Yao Ming levaram a equipe a uma renovação de elenco, apostando em jogadores jovens e bastante flexibilidade salarial. Novamente, o que acaba brilhando é o esquema tático do Rick Adelman com seus passes constantes, armadores que não seguram a bola e cortam constantemente para a cesta, passes para jogadores desmarcados na linha de fundo e ninguém parado assistindo o jogo acontecer. O técnico já colocou em prática esse esquema com uma equipe sem nenhuma estrela antes, já teve muito mais sucesso do que se esperava, mas não conseguiu levar o time aos playoffs sem uma estrela para segurar as pontas. O elenco de agora não deveria ser uma nova tentativa de bater a cabeça contra a parede, já que todo mundo sabe que o Kevin Martin não vai carregar o time nas costas, era pra ser uma reconstrução sem pretensões imediatas, mas é que alguns jogadores acabaram se saindo bem demais no esquema e o que deveria ser uma renovação acabou se tornando uma equipe com chances de pós-temporada. A defesa do Houston, que desmontou completamente sem Yao Ming (e que tem um pivô anão debaixo do aro!), recebeu o apoio de Kyle Lowry e de Courtney Lee pra ficar menos vergonhosa. O Kyle Lowry aprendeu a arremessar de três pontos, qualidade essencial para os armadores do Adelman, e dominou por completo o esquema tático sem forçar as bolas idiotas que o Aaron Brooks forçava todo jogo. O Chuck Hayes, que é um pivô pintor de rodapés, está dominando as jogadas - que o Adelman tanto adora - em que a bola fica nas mãos dos pivôs na cabeça do garrafão. Então a defesa melhorou, Lowry e Hayes garantem que as jogadas fluam como o técnico deseja, as bolas de três estão caindo e é uma coisa linda de ver esse time funcionando ofensivamente. Até que os reservas entrem em quadra e só façam merda, e que a defesa se mostre uma peneira completa e não dê pra se manter no jogo, claro. As poucas jogadas individuais do Houston aparecem com o Kevin Martin (que às vezes força um bocado e enlouquece todo mundo, mas em geral é comportado) e com o Luis Scola, que sempre dá um jeito de pontuar no garrafão - e sempre dá um jeito de que pontuem em cima dele também Mas o banco de reservas, ao contrário, é cheio de jogadas individuais, não consegue segurar o ritmo ofensivo e manter o esquema sonhado pelo técnico. Normal, o banco só tem fraldinha. O ideal seria dar minutos para a pirralhada, ver quem vai continuar na equipe, encerrar o contrato do Yao temporada que vem e reforçar a equipe. Mas as chances de playoff ferraram tudo. O Hasheem Thabeet, que precisa de minutos urgentemente para não morrer de tédio, sequer entra em quadra pra não comprometer as chances de pós-temporada. Ou seja, o time ficou melhor do que deveria e com isso o Thabeet continua servindo só pra pegar lata no alto do armário.

Ninguém apostava nesse Houston sem Yao, sem T-Mac, com um pivô anão e uma estrelinha como o Kevin Martin, e é por isso que ninguém percebe quão genial é o Rick Adelman. A defesa desmontou, quebrou de vez, três anéis vermelhos da morte pra ela, mas o ataque é tão fantástico que colocou esse time desistente na luta por uma vaga e vai vencer mais de 40 jogos na temporada. Quão absurdo é isso? Vale dar o prêmio de técnico do ano para uma equipe que não venceu mais de 50 jogos? Por isso é que vale assistir aos jogos finais do Houston não para ver quão bom é o Kyle Lowry ou o Chuck Hayes, porque diabos, eles simplesmente não são. Vale é para ver a mão do Adelman tornando tudo simples, bonito e orgânico - e um ou outro reserva batendo cabeça, caindo de bunda e a defesa tomando trilhões de pontos. 

O Houston tem ainda 9 partidas: enfrenta Nets fora, Sixers fora, tem uma sequência em casa em que pega Spurs, Hawks, Kings, Hornets, Clippers e Mavs, e fecha a temporada com Wolves fora.


Phoenix Suns

O Suns já era uma equipe reconstruída quando venceu o Spurs nos playoffs com Nash, Jason Richardson e Amar'e Stoudemire. Mas perder o Amar'e foi duro demais para as chances de playoff da equipe, então resolveram jogar tudo fora e finalmente começar de novo. Quer dizer, mais ou menos. Porque tem alguma coisa lá na água de Phoenix que cura qualquer lesão e renova o sangue de qualquer ancião. É lá que o Shaq se recuperou da lesão que o tirou do Heat, que o Jason Richardson se manteve saudável, que o Grant Hill ficou sólido como rocha depois de uma carreira inteira destruída por lesões constantes. Então enquanto o Suns ia pela privada para começar de novo, o Nash estava lá outra vez com suas 11 assistências e 15 pontos por jogo, acertando quase 50% dos seus arremessos, e o Grant Hill estava lá provando que é um dos melhores - se não for o melhor da atualidade - defensores de perímetro da NBA. Nessa altura, os dois deveriam estar cansados fazendo cruzadinha na lareira de casa e tomando Ovomaltine, e não tornando o Suns um time competitivo. No dia final para trocas nessa temporada, o cu piscou e aí os engravatados de Phoenix não conseguiram trocar nenhum dos dois. Trouxeram mais molecada, conseguiram o Vince Carter para liberar 17 milhões de espaço salarial na temporada que vem, mas não conseguiram se desfazer dos dois vovôs que insistem em jogar muito.

Marcin Gortat e Channing Frye estão jogando bem, o Frye também se renovou no Suns e ganhou uns jogos sozinho com suas bolas de três, mas nenhum deles renderia o que está rendendo sem o Nash por lá. Então o time manteve os moleques junto com o armador canadense para que rendam alguma coisa, faz sentido. Mas e aí? Vão manter o Nash por lá pra sempre, mesmo que não tenham chances de título? Ele vai ficar refém de um projeto de reconstrução que nunca acontece simplesmente porque o Nash é bom demais? O contrato do Grant Hill termina nessa temporada, então o Suns tem que decidir isso também: renova com o Grant Hill e seus quase 40 anos? Porque renovar é aceitar que dá pra vencer agora, já, e que os dois veteranos vão receber ajuda. Mas precisa ser ajuda à altura, nos moldes do Amar'e, não dá pra trazer o Aaron Brooks e achar que vai mudar alguma coisa.

O Suns deveria estar se lascando, tropeçando e conseguindo uma baita escolha legal de draft pra reformar a equipe, mas não conseguiu feder porque o Nash e o Grant Hill são simplesmente bons demais. Conseguir uma oitava vaga seria o maior prêmio do planeta para eles, vovôs que não deveriam mais ter que aguentar essa pirralhada tirando meleca do nariz e o Vince Carter dando migué em quadra como se fosse criança mimada. O Carter vai para o banco pelo resto da temporada, de castigo, com Jared Dudley de titular e com a oitava vaga ainda na mira. É difícil, impensável, deveriam ter desistido muito antes, mas é possível e seria muito legal se acontecesse. 

O Suns ainda tem 10 partidas: enfrenta o Kings fora, o Thunder e o Clippers em casa, e aí passeia pelo país: pega Spurs, Bulls, Wolves, Hornets e Mavs fora de casa. Depois ainda enfrenta de novo Wolves e Spurs, mas em casa.

O engraçado é que o Suns e o Rockets enfrentam vários adversários iguais: Kings, Hornets, Mavs, Wolves, Spurs e Clippers, com o Suns enfrentando Spurs e Wolves duas vezes cada. Os adversários diferentes são Nets, Sixers e Hawks para o Rockets (um saco de pancada e dois classificados no Leste) e Thunder e Bulls para o Suns (duas equipes de elite).

Para comparar, o Grizzlies enfrenta Warriors, Hornets fora, Wolves, Clippers, Kings, Hornets, Blazers fora e Clippers fora. Ou seja, assim como o Rockets e o Suns, o Grizzlies também vai enfrentar Hornets, Kings, Wolves e Clippers. Tirando o Hornets, que também luta por posição, são apenas equipes fracassadas e quem  não conseguir vencê-las vai ficar muito atrás na briga pelas vagas. Novamente, são os times pequenos decidindo o futuro de seus irmãos maiores.

Rockets e Suns saíram melhor do que a encomenda, venceram meio sem querer, no meio de um projeto de reconstrução que não esperava exatamente ir parar nos playoffs. É capaz que as duas equipes nem consigam a oitava vaga, é verdade, mas Rick Adelman, Steve Nash e Grant Hill mereciam esse presente - muito mais do que o Grizzlies sem Rudy Gay, que poderá tentar novamente mais tarde, ou até o Blazers assolado por lesões e seu projeto de reconstrução pela metade. Essa reta final da temporada costuma ser a parte mais chata, a gente nem fica com grande peso na consciência quando temos que deixar o blog de lado um pouquinho para cuidar das nossas coisas, mas vale a pena acompanhar como essas equipes continuam tendo chances quando ninguém mais acreditava. E se forem para os playoffs, aí sim todo mundo verá o absurdo de suas campanhas - e dessa vez com muita cobertura do Bola Presa, que aquece os motores pra te matar de tanta leitura assim que a temporada regular terminar.

sábado, 23 de outubro de 2010

Preview 2010-11 / Houston Rockets

Um dia comum na rotina de Yao Ming, após acordar e antes de passar na padaria


Objetivo máximo: Passar da primeira rodada dos playoffs pra mostrar que não foi sorte
Não seria estranho: Não se classificar para os playoffs, ficando na 9a posição
Desastre: Ter o Yao Ming contundido mais uma vez

Forças: Um elenco cheio de especialistas e disposto a jogar coletivamente
Fraquezas: A falta de uma estrela para decidir os jogos e séries mais complicadas, já que o Yao é de vidro

Elenco:










....
Técnico: Rick Adelman

Quando o Adelman assumiu o Blazers em 1989, o time era bom o bastante para chegar aos playoffs mas batia cabeça em quadra, não tinha identidade nem padrão ofensivo. Sob comando do Adelman, foram para os playoffs na temporada que ele assumiu e para a Final do Oeste nos três anos seguintes, ganhando o Oeste duas dessas vezes. Esse é um bom exemplo do que esse técnico pode fazer com um bom elenco. Quando assumiu o Kings em 98, tornou aquele elenco bacanudo num dos times mais legais de assistir de todos os tempos, levando-os a múltiplas finais do Oeste. O truque é uma versão modificada da "Princeton Offense", de que tanto falamos no preview do Cavs. A versão do Adelman se foca mais no jogo entre dois jogadores do que no de três, costuma tirar os pivôs de dentro do garrafão para que eles possam passar a bola para jogadores cortando pelo fundo, e pede mais velocidade e correria ao invés da enorme quantidade de passes e jogo contido da "Princeton Offense". Adelman gosta de contra-ataques e, assim como naquele Suns do Mike D'Antoni, insiste que os arremessos rápidos são melhores do que ficar passando a bola por 24 segundos. Seu ataque é criativo e instintivo, com pouca intervenção do técnico e muita liberdade para os jogadores. Os dois armadores trocam constantemente de papel um com o outro e em geral são os pivôs que iniciam as jogadas com um passe na cabeça do garrafão.

Todos os jogadores dizem que o sistema ofensivo do Rick Adelman é uma delícia de jogar, há liberdade para inovar e improvisar, velocidade e no entanto não tem porra-louquice, as movimentações são bem planejadas. O problema é que além de ser um sistema complexo para aprender e se acostumar, o fato de que ele precisa de criatividade e improviso exige jogadores inteligentes ou que, no mínimo, consigam manter calma e naturalidade nas movimentações. Além disso o sistema deve responder à defesa, sem que existam jogadas fixas, o que costuma deixar as estrelas de lado. Rick Adelman não vai chamar 40 jogadas seguidas para o Yao Ming, a bola deve chegar no pivô naturalmente, quando for possível, como resultado da postura da defesa. É comum ver estrelas jogando pelo Adelman sem receber a bola por longos minutos, o que não lhes deixa muito contentes, e no final dos jogos isso é sempre um problema. Os times de Adelman são famosos por amarelar nos jogos decisivos em parte porque não é natural para o sistema ofensivo colocar a bola nas mãos de um jogador só e deixá-lo decidir. O Kings fodão dos anos 2000 perdeu jogos fantásticos porque a última bola caía nas mãos de um Stojakovic livre - um baita arremessador que se borrava de medo de dar o último arremesso, mas que por estar livre deve receber as bolas no ataque de Adelman. 

O Houston sem Tracy McGrady e sem Yao Ming foi um sonho para o Adelman porque não havia qualquer estrela para encher o saco, seu ataque era seguido à risca, todo mundo recebia as bolas apenas quando elas faziam sentido, e a campanha da equipe foi fenomenal - mas não o bastante para ir para os playoffs numa Conferência Oeste disputada como nunca. Na temporada anterior, o Houston sem T-Mac e com Yao contundido levou o Lakers para um Jogo 7 na semi-final do Oeste, mas não foi o bastante para vencer. Ou seja, o esquema é lindo de se ver, envolve todo mundo, mas não costuma ser muito decisivo.

Além disso, o Adelman é famoso por saber lidar com todo tipo de personalidade. Ron Artest foi para o Houston por afirmar que o Adelman era o único técnico que o respeitava de verdade, e a postura "foda-se, faça o que quiser" do Adelman dá cabo de qualquer jogador-problema. No entanto, dizem que ele é meio relaxado, principalmente nos treinos, e deixa os jogadores livres demais às vezes. Não dá pra agradar todo mundo... 

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Esse Houston Rockets de agora levou bastante tempo para entender a fundo o sistema ofensivo do Rick Adelman. No começo, executavam tão mal no ataque que o Adelman tinha que chamar todas as jogadas, uma por uma, todos os jogos, na lateral da quadra. Aos poucos Aaron Brooks foi se acostumando com a armação, o elenco de especialistas sem estrela alguma abraçou a causa, os jogadores são incrivelmente inteligentes e executaram tudo com perfeição, e o Adelman pode dormir feliz mesmo com um elenco limitado. Em suas próprias palavras:

"Às vezes você tem alguns times que talvez não sejam tão talentosos quanto outros times, mas certamente dá para tirar deles o mesmo que você tiraria de times melhores. Se você consegue com que joguem com todo seu potencial, e joguem duro todas as noites e se esforcem todas as noites, isso já é satisfação. Você não vai ter sempre o melhor time." 

Mas para vencer nos playoffs, o time precisa de ajuda. Apesar de já ter provado que pode jogar sem Yao Ming, aumentando a velocidade dos contra-ataques e se focando mais nos arremessos de três pontos, com Yao em quadra o time ganha um defensor embaixo do aro - mantendo a tática, implementada por Jeff Van Gundy, de fazer com que a defesa afunile os jogadores em direção do Yao e de repente se choquem numa parede de quase 2,30m. Além disso, Yao é um excelente passador da cabeça do garrafão, essencial para iniciar as jogadas de Adelman, e o time é muito melhor com ele em quadra. 

Infelizmente o pivô chinês será limitado a 24 minutos por jogo, o que não tem qualquer relação com sua sexualidade, mas é uma grande sacada para evitar lesões em um esqueleto que não foi feito para carregar aquele peso e aquela altura pulando de um lado para o outro numa quadra de basquete. Quando ele estiver em quadra, ótimo, mas quando não estiver caberá ao recém-chegado Brad Miller assumir a função de pivô passador e arremessador. Brad Miller teve o melhor momento de sua carreira jogando no Kings do Rick Adelman e mostrou ser um excelente passador, além de sólido arremessador de 3 pontos. Na maioria dos outros times, seria mal usado, mas ele nasceu para jogar para o Adelman. Agora, com e sem Yao, o Houston terá um padrão de jogo no garrafão e poderá correr menos, poupando um pouco o fôlego durante a temporada regular.

Como parceiros de garrafão de Brad Miller e Yao Ming, o Luis Scola vem de um Mundial espetacular e como sempre renderá bem no ataque com seu cérebro super-desenvolvido encontrando os espaços livres, enquanto Chuck Hayes cuidará da defesa apesar de ser anão simplesmente incomodando os adversários, cutucando a bola e sendo o marcador mais irritante de toda a NBA. Com a saída de Trevor Ariza, agora Shane Battier volta a ser titular, o que aumenta o QI da equipe em oito mil pontos, garantindo a defesa de perimetro e a movimentação impecável do ataque, com os clássicos arremessos de três da zona morta. Courtney Lee, também nova aquisição, deve ser o reserva do Battier nas funções defensivas enquanto Chase Budinger (que poderia ser estrela de vôlei mas escolheu ir jogar basquete mesmo sendo pior) e seus arremessos precisos de três substituirão Battier no ataque.

A aquisição mais importante da equipe, no entanto, chegou já na temporada passada, mas estava lesionada e demorou para compreender o sistema ofensivo. Trata-se de Kevin Martin, um dos melhores pontuadores da NBA e que detesta a ideia de ter que carregar um time nas costas. Agora, em plena forma física depois de um longo regime de reabilitação e treinamentos nas férias, diz estar pronto para tomar as rédeas do time quando for necessário. Ou seja, Kevin Martin não vai se importar de estar num esquema coletivo que não colocará a bola em suas mãos, mas se diz disposto a decidir as partidas com seu enorme arsenal de movimentos de infiltração (e capacidade mutante de cavar faltas). Ao contrário de T-Mac, que só rende quando joga com a bola nas mãos o tempo inteiro, Kevin Martin brilha por se movimentar bem, arremessar ao receber a bola depois do corta-luz, e pode manter a bola nas mãos justamente nos momentos em que o Houston (e o Rick Adelman, em toda sua carreira) mas sofre: nos minutos finais. Creio que Adelman deve ter percebido que seu time perfeito, sem estrelas, e seguindo seu plano à risca, não foi o bastante para chegar aos playoffs, e que será necessário abrir espaço para Kevin Martin resolver algumas partidas. Se estiver ao lado de Yao Ming, que deve ser poupado para os minutos finais dos principais jogos, o Houston pode ser muito mais forte do que se imagina, com um excepcional elenco de apoio carregando o time quando necessário durante a temporada regular.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Liberdade ainda que tardia

T-Mac machucado lendo revista de mulher. Ele ofereceu 50 conto para não publicarmos a foto.


Quando Tracy McGrady chegou ao Houston Rockets, era sua primeira chance de ser a estrela de um time de verdade. Isso porque, no caso do Magic, chamar aquela joça de "time" era ser bastante bonzinho - o único outro jogador de verdade era o Grant Hill, que não chegou a jogar por contusão. Em Houston as coisas mudaram bastante: T-Mac era o grande reforço que tornaria Yao Ming campeão, mas as contusões lascaram os dois. O time, que agora é um time de verdade, segura as pontas sozinho a ponto de nem pensar mais em McGrady. Em Orlando era ele quem segurava um time que não existia, em Houston o time é tão bom que não precisa dele.

Em nenhum desses dois extremos T-Mac poderia dar certo. Quando foi cestinha da NBA seus esforços eram inúteis e foi, como todo grande jogador em time medíocre, tratado como perdedor, nos moldes de Kevin Garnett. Quando jogou em um time coletivo, não conseguia produzir sem reter a bola e diminuir o ritmo da equipe, decidiu passar a bola e foi tratado como amarelão, assumiu toda a responsabilidade pelo time nos playoffs e aí o elenco lhe deixou na mão nos momentos cruciais. Nunca houve um momento de equilíbrio, uma situação em que ele precisasse do time tanto quanto o time precisasse dele.

O técnico Rick Adelman sempre sonhou com um tipo bastante específico de basquete: coletivo, em que todos participem do ataque, criativo, com total liberdade para os jogadores, e baseado na constante movimentação de cada uma das peças da equipe. Na teoria é lindo, cheio de borboletas e pôr-do-sol e fadinhas coloridas, mas na prática exige uma caralhada de jogadores inteligentes que entendam perfeitamente a filosofia por trás dessa brincadeira. O Kings regido por Adelman, quando finalmente pegou o jeito, era uma maravilha de ver. Não ganhou bulhufas, tinha problemas claros, mas funcionava tão bem basicamente pela inteligência de três jogadores:
Vlad Divac
, Chris Webber e Mike Bibby. Os dois primeiros figuram entre os melhores passadores de todos os tempos dentre jogadores de garrafão. O terceiro estava sempre disposto a dar o passe certo, sem frescuras - motivo pelo qual foi amado-idolatrado-salve-salve quando chegou à equipe no lugar do firulento Jason Williams, que curte a ideia de passar bolas enquanto equilibra pratos no nariz. Quando mais Rick Adelman teria outra oportunidade de encontrar jogadores tão eficazes, inteligentes e capazes de colocar sua filosofia ofensiva em prática?

O Houston Rockets parecia uma boa ideia (o Yao Ming é um excelente passador, e não é porque eu tenho fetiche por chineses gigantes não), mas o time era lento, tinha dificuldades em correr, segurava demais a bola e faltavam arremessadores. Tanto Yao quanto T-Mac sofreram bastante tentando abraçar as ideias de Adelman, porque quando faziam a bola rodar, eram criticados por não serem agressivos. Por um bilhão de vezes, Yao chamou uma marcação dupla no garrafão e passou a bola para fora, onde ela girava de encontro a um arremessador livre. Não é exatamente o que se espera de uma estrela de seu calibre passar um jogo tendo arremessado apenas um par de vezes. Eu nunca aceitei muito bem como o Yao era mal aproveitado no esquema, mas era um caso em que a postura do técnico sempre falou mais alto do que os jogadores que deveriam obedecê-la. Não interessava se havia um chinês gigante e um dos maiores cestinhas de todos os tempos na NBA, a postura ofensiva do Rick Adelman já chegou montada e não era maleável. O time que se adaptasse a ela.

É por isso que, justamente nas contusões de Yao e T-Mac, o sistema ofensivo floresceu. O resto do time, inteligente mas com menos talento, pressão ou potencial, parecia perfeito para o Rick Adelman. A escolha do Houston por trazer Trevor Ariza foi tratada com dúvida, "será que ele é jogador para ser estrela, para ser cestinha, para jogar sozinho, liderar um time?". Ninguém entendeu que a comissão técnica procurava justamente isso, um jogador que não fosse estrela, que não pudesse jogar sozinho, que não tivesse pretenções de liderar uma equipe. Esperava-se mais um jogador secundário e inteligente, e isso todo mundo que assistiu ao entendimento relâmpago do Trevor Ariza com relação ao sistema de triângulos do Lakers sabia que o Houston tinha conseguido.

Não há estrelas, não há líderes, não há jogadores que possam dominar o jogo sozinhos. Finalmente a presença de Rick Adelman é maior do que aquilo que está em quadra, é quase como se fosse ele a jogar ali todas as noites. Nunca um elenco entendeu tão bem sua filosofia nem executou tão bem seu plano ofensivo. É o elenco mais inteligente em que o técnico colocou suas mãos, a rotação é definida, todo mundo compreende seu papel e faz diretinho sem reclamar. Pode não dar certo sempre, mas mesmo as derrotas saem sempre como planejado. Durante as últimas temporadas, Rick Adelman passava todos os jogos chamando as jogadas ofensivas em voz alta no banco de reservas, decidindo o que o time deveria fazer em cada posse de bola, e quando parava de fazê-lo - deixando o time tomar as próprias decisões - a coisa descambava para a pourra-louquisse (algo tipo o Knicks de hoje em dia) e ele voltava a chamar as jogadas. Nessa temporada, a câmera durante as partidas insiste em mostrar um Adelman em silêncio, coçando a cabeça, cutucando a barba, apertando o nariz. É a imagem mais clara de que seu plano deu certo. E a constatação óbvia de que ter McGrady de volta lhe dá mais arrepios de medo do que ter que ver a Playboy da Fernanda Young.

Foi por isso que o T-Mac saudável recebeu a postura do "vamos fingir que ele não está aí para ver se desaparece", algo que o Pacers fez com o Jamaal Tinsley e que todos os seres humanos fazem com novela da Record. Mas no caso do Tinsley, o time arrancou até seu nome dos armários da equipe, a gente fica imaginando ele chegando para o jogo e não ter sequer onde se trocar, ao ponto de se esconder num cantinho da parede e ficar cantando músicas de ninar. Com o T-Mac a coisa foi bem mais sutil, falou-se sobre o medo de sua condição física, de ritmo de jogo, pavor de que ele voltasse a desmanchar o joelho - tudo bastante infudado porque ele passou as férias inteiras treinando com os melhores e competindo com jogadores de peso da NBA. Mas tudo também bastante justificável, tendo em vista que voltas apressadas por parte do T-Mac tiveram resultados catastróficos. Então usaram isso como uma desculpa sincera e mantiveram McGrady longe das quadras o máximo de tempo possível, ao ponto da paciência torrar e do T-Mac aparecer para jogar, vestido com o uniforme, mesmo sem a liberação da equipe. Talvez o Rick Adelman quisesse sumir com a placa do T-Mac do vestiário do Rockets, mas preferiram uma abordagem mais diplomática. O problema é que, cedo ou tarde, não daria para manter a postura. Uma hora ele teria que entrar em quadra.

Quando o Trevor Ariza foi pentelhado o jogo inteiro pelo DeMar DeRozan e deu uma cotovelada no ar (louvada seja sua falta de mira), acabou suspenso pela NBA. Além de umas piadinhas na equipe chamando-o de boxeador frustrado e da própria compreensão do Ariza de que ele perdeu a paciência e foi só isso ("me suspende, pronto, e depois deixa eu jogar"), a suspensão lascou a rotação da equipe e deixou bem claro aquele Tracy McGrady quietinho sentado no cantinho do banco, no maior estilo gordinho descoordenado que fica sentado encolhido esperando alguém escolher ele pra jogar na Educação Física. Não havia qualquer desculpa que pudesse impedí-lo de jogar e então, contra o Detroit Pistons, T-Mac entrou em quadra.
Shane Battier foi para o banco depois de uns minutos de jogo e McGrady entrou em seu lugar. Jogou por 7 minutos, até o final do primeiro quarto, e depois não voltou mais, com a desculpa de que não tem ritmo de jogo e não valhe a pena comprometer o ritmo da equipe por isso. Já foram três jogos e o que ocorre é sempre igual, esses minutinhos poucos e controlados. A torcida foi à loucura quando ele finalmente entrou em quadra, teve orgasmos múltiplos quando ele converteu sua primeira cesta, mas lá no fundo todo mundo vê a verdade, um T-Mac com dificuldades para correr, que não sabe para onde deveria passar a bola e que não defende nem ponto de vista. Nessa altura das coisas, não há muito que McGrady possa acrescentar que o time já não faça bem - pontuar, encontrar companheiros livres, arremessar do perímetro - e, ao contrário, sua saída debilita o time defensivamente, já que Ariza e Battier são excelentes defensores. Contra o Nuggets chegou a ser ridículo: assim que T-Mac entrou em quadra o Carmelo Anthony começou a devorar o Houston vivo com azeite e sal. Para que ele entrou em quadra, então? Por mais triste que seja, ele não é mais necessário.

O bonitinho dessa história é o discurso de Tracy McGrady, de que ele não tem nada a provar a ninguém: já foi All-Star sete vezes, cestinha da NBA por duas, frequentou os playoffs com constância. Tá bom que nunca passou da primeira rodada, nunca ganhou nada, mas deixou seu nome na história como um dos grandes de seu tempo. O que T-Mac diz querer é provar coisas para ele, provar que ainda pode jogar, que venceu suas contusões, que pode se encaixar. Seu discurso nunca soube encontrar um equilíbrio, em horas colocava todo o peso nas suas costas, em outras responsabilizava seus companheiros. Agora ele sabe que é desnecessário e no discurso só quer entrar em quadra e mostrar que pode jogar. Sem ser líder, sem responsabilidades, sem ganhar um título. Até porque essa postura é a mais capaz de lhe levar a um título. Nem ele nem nós, torcedores, podemos esperar grandes coisas: uns minutos aqui, outros minutos ali, umas bolas no último segundo, dar uma força no ataque em momentos específicos do jogo. Ou seja, tornar-se mais um jogador secundário e inteligente nas mãos de Rick Adelman. Se ele compreender que é apenas um grão de areia nas mãos do todo-poderoso técnico, jogará pouco e conquistará muito.

Será uma pena ver seu talento mal aproveitado, e muito possivelmente ele procurará outro lugar em que possa ter a bola nas mãos na temporada que vem, quando seu contrato finalmente termina. Mas se o seu discurso for real, o Houston será uma oportunidade fantástica de lhe tirar o peso nas costas, o caráter de estrela que sempre lhe podou o estilo de jogo, a fama de amarelão, as contusões que sempre lhe cobraram por um corpo que se esforça demais. É a chance que T-Mac tem de ser livre - tudo que ele tem que fazer é se deixar escravizar por Rick Adelman. A torcida de Houston vibra quando McGrady entra em quadra, resquício dos velhos tempos, mas a real felicidade está em vê-lo funcionando num papel limitado. Aplaudamos Tracy McGrady por tudo que ele fez, mas sejamos abertos àquilo que ele quer e pode fazer agora: vencer jogos, liberto das pressões que colocou em si mesmo. O engraçado é que trata-se do mesmo futuro que aguarda Yao Ming, desnecessário, pressionado, contundido. Que os dois, então, pequenos perto de Rick Adelman, possam ser livres.

sábado, 28 de novembro de 2009

Muito ajuda quem não atrapalha

Aqui jaz um McGrady


Enquanto Allen Iverson decidiu se aposentar e provavelmente apenas vai tirar um ano de folga pra fazer umas cruzadinhas em casa, outra estrela se segura pelas beiradas para não se aposentar: Tracy McGrady. A diferença principal é que, ao contrário do Iverson, McGrady está sendo aposentado, não se aposentando.

Os problemas de saúde do T-Mac são antigos, desde seus tempos de Orlando Magic. Sempre sentiu dores terríveis nas costas, o que era bastante simbólico já que ele carregava a equipe inteira sozinho sendo o cestinha da NBA. No Houston, as dores nas costas começaram a dar as mãos para uma dor no joelho. Toda vez que um chinês espirrava no mundo, McGrady perdia um jogo graças a alguma contusão. As partidas que jogou ao lado de Yao Ming foram pouquíssimas ao longo dos anos, porque sempre um dos dois tinha virado farofa - McGrady, sozinho, perdeu 125 partidas ao longo de suas 6 temporadas em Houston. Aos poucos, a equipe teve que aprender a se virar sem os dois. Mas o que sempre estragou as coisas era aquele ar de dúvida, "será que o McGrady vai ou não vai jogar essa noite?", porque ninguém sabia que papel teria em quadra e como enfrentaria o outro time até o último segundo, quando o estado do T-Mac era liberado. Alguns jogos ele entrava, outros não, e o time inteiro ficava refém de sua condição. Nem sei se o Houston tinha "Síndrome de Gilbert Arenas", aquele fenômeno que faz o Wizards jogar melhor sem sua estrela (e o Kings chutar traseiros sem o Kevin Martin), o que importa é que o time jogava muito melhor tendo certeza de que o T-Mac não iria entrar em quadra do que quando ficava na dúvida.

Conforme o Houston foi pegando mais as manhas do esquema do técnico Rick Adelman e abraçando um basquete mais coletivo, começou a ficar meio óbvio que o McGrady não era tão importante assim. Foi sem ele que o time passou da primeira rodada dos playoffs, foi sem ele que o time surpreendeu todo mundo e se mantém na elite do Oeste mesmo sem nenhum sinal de estrela. Mas o tempo passa, o tempo voa, a poupança Bamerindos foi à falência, e eis que a reabilitação de Tracy McGrady está completa: ele pode voltar a jogar.

A verdade é que, depois da temporada passada, T-Mac foi liberado para treinar em Chicago, no paraíso dos ratos de ginásio, com o sujeito responsável por fazer Dwyane Wade voltar de contusão e quase ser MVP. T-Mac passou todas as suas férias treinando com o próprio Wade e com o Devin Harris em regime integral, sem falar nos outros jogadores que sempre dão uma passadinha para torrar suas verdinhas e tentar se manter em forma. Para participar dos treinos, McGrady foi liberado por um cirurgião fodástico - ainda havia dor, mas o corpo estava recuperado.

Quando a temporada começou, no entanto, o Houston preferiu não liberar o T-Mac para jogar. Sequer deixaram que ele participasse dos jogos de pré-temporada. Disseram que dessa vez ele precisava voltar com o corpo impecável e sem qualquer sinal de dor, ou seja, disseram que ele precisava nascer de novo ou trocar de corpo com a mãe, tipo aquele filme com a Linsey Lohan. Juntos, marcaram uma data para sua volta, mas desde então continuam adiando à espera de mais e mais exames, alegando que os resultados ainda não são suficientes. O Iverson percebeu que não era querido no Grizzlies em apenas um jogo, ele precisa dar uns toques para o McGrady perceber que o pessoal em Houston não parece gostar muito do sujeito.

Os motivos são bem óbvios e não muito nobres: após perder 41 jogos seguidos, a NBA passa a devolver para o time até 80% do salário do jogador bichado. É quase um seguro para jogadores com defeito de fabricação e acredito que, secretamente, essa regra deve chamar "Cláusula Tracy McGrady", porque nenhum jogador de basquete passa mais tempo contundido na história do esporte do que ele. Com um time funcionando bem pra burro, temores reais (e bem válidos) de que seu jogo interrompa a química do time e o jogo mais coletivo da NBA até agora, e o maior salário da NBA na temporada (são mais de 23 milhões de doletas!) podendo ser devolvido em grande parte para os cofres da equipe, não é surpresa nenhuma que estejam empurrando T-Mac com a barriga. Todo mundo por lá quer mais é que ele encha o saco e aposente, como o Iverson, e como seu contrato acaba ao fim da temporada, ele pode voltar ano que vem e arrumar outra equipe que tope lidar com suas contusões.

Mas o McGrady não está muito interessado em se aposentar, deve ter enjoado de fazer cruzadinhas nesse tempo todo que passou lesionado. Quando ele cansou de perder, de jogar em times que fediam, de ter dores terríveis nas costas, falou para os jornalistas que jogaria apenas mais alguns anos, ganharia um título e daria o fora desse esporte idiota. Mas o título, que parecia tão plausível no Rockets, foi ficando cada vez mais distante, a maldição de não passar da primeira rodada dos playoffs foi pegando cada vez pior pro currículo, e agora o papo de aposentadoria deixou de vir à tona. Com o fim do seu contrato, é bem possível que T-Mac aposente, principalmente se apenas o Grizzlies se interessar em lhe oferecer um contrato mequetrefe, mas o mais provável é que ele ainda tenha muita energia para tentar mudar a fama que adquiriu nos últimos anos. Sem dores pela primeira vez desde que chegou a Houston, tendo aprendido a centralizar menos o jogo, atacar menos a cesta e a armar as jogadas da equipe, McGrady quer mostrar que pode vencer, que pode se encaixar, que ele só se lasca porque está doendo ou porque seu time fede. Ou seja, ainda não está preparado para assumir a responsabilidade pelos seus fracassos.

Então, com isso em mente e de saco cheio de ficar sendo deixado de escanteio (prática conhecida como "a técnica ninja Jamaal Tinsley de ignorar um jogador tempo o suficiente para ver se ele desaparece sozinho"), T-Mac vestiu seu uniforme mesmo sem ter sido liberado pela equipe e foi se aquecer normalmente como se estivesse listado para a partida. Sentou no banco de reservas, torceu pelos companheiros, e a torcida ficou mesmo achando que ele entraria em quadra. Ele próprio sabia que não entraria, mas a ação foi o bastante para gerar uma discussão épica com o técnico Rick Adelman nos bastidores e alertar o planeta inteiro de que ele quer e pode jogar, é o time que não deixa.

Estou me divertindo muito com o Houston nessa temporada, o time fede mas funciona, o jogo é bonito de se assistir, o banco de reservas é cheio de energia, o elenco é recheado de especialistas e todo mundo está disposto a dar um passe a mais. Mas no final do jogo contra o Spurs, ontem de noite, faltou alguém para decidir o jogo no finalzinho - Kyle Lowry estava no fim da bateria e o Trevor Ariza não é particularmente decisivo, nem anda com a pontaria boa. Contra o Mavs foi ainda pior, sem uma jogada de segurança quando as coisas estavam dando errado, o Houston tomou um pau vergonhoso. A previsão para a equipe continua: vão ganhar muitos jogos, ir para os playoffs, mas não tem como ganhar dos times grandes de verdade, principalmente em uma série de 7 jogos. Ninguém vai querer enfrentar o Houston, isso é verdade, porque os jogos vão ser brigados, suados e censurados para menores de 18 anos, mas a vitória seria difícil.

Aquele Tracy McGrady que participou da sequência de 22 vitórias seguidas do Rockets se encaixaria nesse time. Jogaria de armador, abusaria nos passes, arremessaria de longe mas sem forçar arremessos. Já o McGrady de antes afundaria esse time, todo mundo iria parar para ver a estrelinha jogar e todo o coletivo iria para o buraco. É por isso que eu confio no T-Mac: ele sabe se adaptar, sabe mudar seu jogo, é capaz de jogar pelo coletivo - só não consegue assumir a responsabilidade nas horas decisivas, mas certamente consegue pontuar quando ninguém mais está tendo sucesso. Só não sei se, nos moldes do Iverson no Grizzlies, ele toparia jogar só uns 20 minutos por jogo para continuar dando espaço para toda a pirralhada que está mantendo o Houston vivo. Sou a favor de sua volta, e é bem claro que ele quer voltar, mas não sabemos do que ele está disposto a abrir mão para isso.

Assim como o Jamaal Tinsley foi ignorado no Pacers até desaparecer e agora tem nova chance no Grizzlies (sempre o Grizzlies, pegando essas estrelas em decadência), que aliás está aproveitando muito bem, McGrady pode passar a temporada ignorado no Houston e ano que vem arrumar espaço em outra equipe para aproveitar o pouco que sobra no seu tanque (e no seu saco). Só esperamos que ele não seja aposentado antes da hora contra sua própria vontade apenas por razões financeiras. No Houston, a política é que o T-Mac ajuda quando não estraga o time e quando devolve seu salário para os engravatados, mas se isso levar McGrady a se aposentar será uma enorme tristeza. Ele e Iverson podem ter papeis secundários na NBA, mas ainda são capazes de transformar partidas, adaptar seus jogos e iluminar esse nosso esporte que já tem saudade dessas estrelas. Quer dizer, o Grizzlies não tem saudade de nada - e o Houston, se receber o dinheiro de volta, também não.

domingo, 8 de novembro de 2009

O Houston das adversidades

Os da ponta defendem, o do meio não joga


Dois anos atrás, 0 Houston estava com dificuldade de colocar em prática o basquete livre e complexo proposto por Rick Adelman em sua primeira temporada com o time. O técnico pedia paciência, explicando que aos poucos a equipe estaria plenamente familiarizada com o esquema tático. Quando a água bateu na bunda e o Rockets começou a escorregar na tabela, finalmente o elenco pareceu abraçar o que era proposto. Com um basquete de velocidade, passes rápidos no jogo de meia quadra, arremessos do perímetro e um pivô na cabeça do garrafão chamando as jogadas ofensivas, o Houston ganhou 12 partidas seguidas e provou que era um time de verdade. Mas como nós sabemos que o Yao Ming parece "made in Taiwan", que é o Paraguai do oriente, o pivô chinês quebrou a perna e ficou fora pelo resto da temporada.

Sem espaço para desespero, tudo que Rick Adelman fez foi aumentar o ritmo ofensivo, focar ainda mais no contra-ataque e pedir passes mais velozes e mais arremessos de três. Sem o Yao pra ficar correndo de um lado para o outro com a língua pra fora, o time passou a jogar numa porra-louquisse e mesmo assim finalizar com calma. Mesmo sem o pivô, ganharam mais 10 partidas seguidas, conseguindo a segunda maior sequência de vitórias de todos os tempos e classificaram-se em quinto lugar no Oeste, para então serem eliminados (mas disso não quero falar, hunf).

Na temporada seguinte, Ron Artest foi adicionado à equipe e todo mundo começou a achar que talvez o Houston tivesse chances de título. No entanto, Tracy McGrady passou a maior parte da temporada contundido. Foi sem ele que o time passou finalmente da primeira rodada dos playoffs e foi enfrentar o Lakers na semi-final. Perdendo por 2 a 1 na série, Yao Ming se arrebentou de novo, todo mundo bocejou porque era óbvio que isso eventualmente iria acontecer, e então a série foi dada como encerrada. No entanto, aquela equipe cheia de carregadores de piano e nenhuma estrela venceu mais duas partidas e levou o embate com o Lakers para o sétimo jogo, aliás o único time a levar o Lakers para um jogo 7 naqueles playoffs.

Chegamos então ao Houston de agora. A lesão do Yao Ming, que ainda pode encerrar sua carreira, garante que ele não volta para o time nessa temporada. McGrady, que operou seu joelho pela nonagésima vez (graças a um plano fidelidade com o cirurgião, dessa vez saiu de graça), volta só no ano que vem. Ron Artest, que segurou o time nos playoffs passados, foi concretizar seu sonho de infância e jogar com seu ídolo Kobe Bryant. O que sobrou? Trevor Ariza, que era a quinta opção ofensiva no Lakers, exemplifica a equipe: um monte de jogadores secundários, sólidos, carregadores de piano, que seriam capazes de ajudar qualquer equipe que contasse com um par de estrelas. Mas sem as estrelas, cabe ao Rick Adelman tornar esse bando de coadjuvante um time de verdade.

"Às vezes você tem alguns times que talvez não sejam tão talentosos quanto outros times, mas certamente dá para tirar deles o mesmo que você tiraria de times melhores. Se você consegue com que joguem com todo seu potencial, e joguem duro todas as noites e se esforcem todas as noites, isso já é satisfação. Você não vai ter sempre o melhor time."

A frase de Rick Adelman pelo menos nos mostra que ele está satisfeito. O time pode ser uma droga, mas se ele tirar o melhor do elenco já poderá dormir de noite. Na primeira partida da temporada, deu pra perceber que o time não teria chances de chutar traseiros nos playoffs mas que ganharia muito mais partidas do que se imaginava. É sempre assim, quando o Houston perde as estrelas e precisa depender de correria e de jogadores mais-ou-menos, especialistas em aspectos específicos do jogo, as coisas acabam dando estranhamente certo. No primeiro jogo eu tive uma crise de diarreia porque foi asqueroso ver o time jogando só na raça, na unha, sem saber o que fazer, mas foi só o susto. A derrota na estreia para o Blazers foi devolvida, com uma vitória fácil em cima do mesmo time de Portland, e misteriosamente o Houston se tornou um time delicioso de se assistir. Não tem estrela, não tem showzinho de LeBron ou Kobe, mas tem um grupo de oito jogadores que toma as decisões certas, dá sempre um passe a mais, não força arremessos e joga com velocidade. É um tesãozinho de assistir, dá tanta água na boca quanto o ensaio da Alinne Moraes de lingerie.

O ataque é o sexto melhor em pontos marcados na NBA até agora, atrás apenas de Suns, Nuggets, Magic, Raptors e Grizzlies. No entanto, dessa lista apenas o Magic tem uma defesa que toma menos pontos do que o Rockets. Ofensivamente a ideia é correr bastante, apostar no contra-ataque, e abusar dos arremessos de três quando é preciso um basquete de meia quadra. Defensivamente, a ideia é colapsar todos os jogadores juntos rumo ao garrafão frente a qualquer infiltração, e depois morder na defesa de perímetro com jogadores especialistas nisso como Shane Battier e Trevor Ariza. O vídeo abaixo dá um bom exemplo da defesa que o Houston anda aplicando:



Chega a ser engraçado, parece futebol feminino amador em que todo mundo corre pra cima da bola. Isso torna o Houston exposto a times que penetram e depois passam para fora, e também complica nos rebotes mais longos típicos dos arremessos de três, mas é a única chance de defender o garrafão num time sem nenhum pivô sequer. O titular na posição é o Chuck Hayes, que não tem sequer dois metros! Com 1,98m de altura, o Hayes é de longe o pivô mais baixo que a NBA já viu, seria até o pivô mais baixo do campeonato amador de Catanduva, e por isso precisa de toda ajuda do mundo na marcação. No entanto, o Hayes é um defensor pentelho pra burro, ele estabelece sua posição, intercepta passes e fica cutucando a bola antes de chegar no pivô adversário. Não consegue impedir uma cesta, só sai do chão usando escada rolante, mas inferniza qualquer um e é um dos seis melhores ladrões de bola da temporada, com mais de dois roubos de bola por jogo. O Dwight Howard comeria ele com um pouco de azeite e sal, talvez uma salsinha pra dar gosto, mas é certeza de que o Hayes vai encher um pouco o saco e o Houston inteiro vai pular no cangote do Dwight na cobertura. Aí os arremessos de três do Magic vão trucidar o Rockets, claro, mas é um plano melhor do que se lascar em todo jogo tipo o pobre do Warriors.

O Ariza faz um serviço cada vez melhor na defesa, mas o andamento das partidas depende muito dele ofensivamente. No contra-ataque ele é veloz e explosivo, seus roubos de bola viram enterradas, e mantém o Houston no jogo. Mas é nas suas bolas de três que fica a esperança do time. Ele ainda não tem a capacidade de decidir o jogo criando seus próprios arremessos, e ainda tem muitos problemas batendo para dentro. Na hora do desespero, quando o Houston precisa de uma infiltração, prefere isolar o Aaron Brooks e deixar ele partir pra cima. Mas o Ariza é inteligente, sabe quando arremessar (coisa que o Artest nunca soube), e quando tem bom aproveitamento prova que pode segurar um time nas costas volta e meia. Na pré-temporada e no primeiro jogo do Rockets, Ariza forçou o jogo, ainda bitolado nessa ideia de que ele precisa ser uma estrela, a primeira opção no ataque. O Kobe deu uns conselhos, disse que conhece bem essa transição, e que ele só precisa ir com calma. Agora, parece que ele finalmente entendeu que tem que liderar os contra-ataques, se focar na defesa, nos arremessos de fora, ser um jogador especialista como todos os outros do elenco. Numa equipe em que cada um tem uma função e a mistura precisa ser maior do que a soma das partes, o Ariza não tem que ser estrela coisa nenhuma, tá muito bom se ele fizer seu papel também e todo mundo confiar no trabalho coletivo planejado pelo Rick Adelman. Ele já tirou de letra a perda do Yao, a perda do T-Mac, e não está em busca de um jogador fora de série para se destacar nesse grupo. Quando o McGrady voltar, provavelmente deve ter também minutos reduzidos e um papel secundário, armando jogadas, sem forçar seu físico destruído indo para a cesta.

Por enquanto, a rotação é pequena, com apenas oito jogadores. Battier e Ariza defendem e arremessam de fora, Aaron Brooks bate para dentro mas também é bom arremessador, Luis Scola é o único com um jogo sólido dentro do garrafão, e o Hayes torra a paciência dos pivôs adversários. No banco, Kyle Lowry defende bem como armador, o novato Chase Budinger arremessa bem de três e confunde os adversários por ser loiro e mesmo assim jogar basquete, e Carl Landry prova que veio da máquina de faser Jason Maxiells e leva sua vida nos rebotes ofensivos e marcando pontos fáceis. Qualquer um deles, num dia bom, pode vencer uma partida sozinho. Mas é a junção de todos eles que torna o time tão perigoso. David Andersen é um pivô que veio da Europa dar uma força mas na verdade é só um ala improvisado e envergonhado demais para arremessar, e o Pops Mensah-Bonsu ainda não teve oportunidades, então a rotação é bem limitada mesmo e vai receber de braços abertos o McGrady para dar uma força. Mas até lá, o time vai estar muito bem.

Contra o Lakers, no já lendário "Clássico Bola Presa", Kobe teve que marcar 41 pontos para permitir a derrota do Houston por um mísero ponto na prorrogação. No Houston, seis jogadores marcaram pelo menos 14 pontos e Chuck Hayes saiu de quadra com 14 rebotes mesmo enfrentando Andrew Bynum no garrafão. Se tem como dar canseira no atual campeão com um time desses, cheio de caras secundários, então não tenho dúvidas de que o Houston vai se sair bem na briga pelas vagas de playoffs no Oeste. Por enquanto o time está na frente de Mavs e Spurs e é líder de sua divisão, e esse absurdo tem ainda mais valor quando a gente pensa em como o Houston está conseguindo esse sucesso: sem suas estrelas, nas mãos de um dos melhores técnicos que a NBA já conheceu, e com um basquete bonito, solidário, veloz e que deixa aquela lagriminha de saudade do Kings de uns anos atrás, quando o Stojakovic ainda sabia arremessar. Para quem gosta de torcer pelo mais fraco e para quem gosta de ver um jogo coletivo e metido a porra-louca tipo o Knicks mas com regularidade e sem tanto fracasso, o Houston Rockets merece sua audiência. Aplaudamos o Rick Adelman agora, enquanto ele tira água de pedra, porque é bem possível que com as estrelas de volta ele não consiga a mesma mágica. Tanto ele quanto a equipe só rendem de verdade nas adversidades. E não há nada mais bonito do que ver um grupo de pessoas lutando contra as adversidades, ainda que para isso tenhamos que ver um nanico jogando de pivô e morrer de vergonha.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Transtorno bipolar

"Dê um cacete no Lakers", já diria a tradução livre


Foram 6 jogos na série entre Lakers e Rockets e, ainda, não fazemos a menor idéia de como cada time entrará em quadra. Já vimos os dois times sendo humilhados, os dois times tendo vitórias fáceis, os dois times empolgados e os dois times sentados miseravelmente na guia da calçada esperando que o mundo acabe logo e de uma vez. Essa série deveria ser passada nos cursos de Psicologia como exemplo de "transtorno bipolar", é simplesmente patológico.

Na tentativa de compreender o comportamento desses dois times, como se fossemos um documentário de animais do Discovery, vamos dar uma olhada em 5 razões para o Houston ter saído de quadra ontem com a vitória.


1. A Argentina

Ao fim da partida, Aaron Brooks foi entrevistado ainda em quadra, e a primeira pergunta foi o que havia acontecido para que o Houston Rockets tivesse conseguido uma vitória tão impressionante. A resposta foi simples:

"Luis Scola!"

Foi ele quem aconteceu. Sem Yao Ming, o Houston não tem uma presença ofensiva no garrafão. Um anão tirando um cochilo de biquini seria uma ameaça ofensiva no garrafão maior do que Chuck Hayes, que está substituindo o chinês no elenco titular. Quando Yao recebia marcações duplas, tanto contra o Blazers quanto contra o Lakers, era Luis Scola o homem livre que deveria punir os adversários por ignorá-lo. Com Chuck Hayes em quadra, Scola nunca está livre mas tem uma pressão ainda maior de estabelecer um jogo no garrafão.

O Houston perdeu o jogo 5 por uns 40 pontos, tão humilhante quanto pagar peitinho no Big Brother. Um dos maiores motivos foi que, sem Yao, o time só tinha como recurso arremessar bolas de três pontos. No jogo anterior elas haviam caído, mas quando não caíram o resultado foi brutal. Dessa vez, com Scola assumindo a responsabilidade de pontuar debaixo do aro logo no começo, o time não se permitiu ficar apenas arremessando de fora, o que mudou completamente a história da série e pegou o Phil Jackson de calças curtas.

O Luis Scola fede mas simplesmente chuta traseiros, e ontem isso ficou mais óbvio do que nunca. Seu arremesso é feio e inconsistente, seus ganchos são desengonçados, ele não sai do chão e não tem a força física para se impor nem no ataque e nem na defesa. Justamente por isso, Scola comanda: joga para a equipe, faz tudo aquilo que for necessário (de cavar faltas de ataque a fazer café), escolhe as jogadas mais simples e contribui nas pequenas coisas. Não vai impedir uma cesta mas vai tomar uma trombada, não vai enterrar no Gasol mas vai girar com facilidade usando seu inteligente jogo de pernas. Scola é o exemplo perfeito do jogador que é bom porque é ruim, em que a inteligência e a consciência das próprias limitações levam o jogador à excelência.

No próximo jogo, Scola pode não ser tão efetivo, pode ser melhor marcado (no segundo tempo, sofreu marcação dupla em todas as bolas e caiu muito de rendimento), mas fará sua parte do modo que ele inventar na hora. Nem que seja lavando a louça, secando a quadra, vendendo pipoca.


2. O Phil Jackson é um cara legal

O Houston Rockets tem falhas óbvias, e o Phil Jackson é um dos melhores técnicos a já ter respirado na atmosfera terrestre. A única razão plausível para o técnico zen não explorá-las é porque ele é um sujeito bacana e quer manter a série equilibrada mesmo com o Houston sendo, obviamente, o time mais fraco. O exemplo mais importante é Chuck Hayes. Acho que todo mundo já viu como o sujeito cobra lances livres, parece que ele está em trabalho de parto ou tendo convulsões (talvez esteja). Na tempora regular, acertou 36% dos seus lances livres, algo que o Shaq conseguiria se arremessasse de costas. Para a sorte do Houston, Hayes não passa muitos minutos em quadra e, nunca, absolutamente nunca, está em quadra nos minutos decisivos.

Só que o Yao Ming é "made in Taiwan", como todos nós sabemos, e está com defeito de fabricação. Chuck Hayes, então, é titular e está o tempo todo em quadra. Se quisesse, Phil Jackson poderia ter usado a técnica do "hack-a-Shaq" (ou "faça uma falta intencional no Hayes para levá-lo para a linha de lances livres, mas tente ser mais explícito do que o Antoine Wright, por favor!") e o Houston seria obrigado a tirar de quadra esse epiléptico descoordenado.

Para quê fazer isso, você se pergunta? Afinal, Hayes é inútil no ataque e mantê-lo em quadra garante que o Houston jogue com apenas 4 jogadores no lado ofensivo. Acontece que Hayes é um excelente defensor no garrafão. Anão, nunca conseguiu sair do chão, mas marca de maneira física, incomoda e rouba muitas bolas, desviando passes. Ele nunca vai dar um toco, nunca vai contestar um arremesso, mas ele impede que Pau Gasol possa se aproximar da cesta e obriga o espanhol a arremessar por cima dele. Sua marcação ontem foi impecável e o Houston teria perdido muito de sua defesa sem ele em quadra.

Hayes também permite, simplesmente por existir, que o Lakers faça marcação dupla em outro jogador em todas as posses de bola do Rockets, porque é como se ele não tivesse braços. Apenas no segundo tempo isso aconteceu, e o Lakers chegou a cortar para 3 a vantagem monstruosa criada logo no primeiro quarto (o Houston começou o jogo com um sensacional 17-1). O Phil Jackson não gosta de dobrar, não gosta de faltas intencionais e não deve gostar muito de ganhar. Obrigado, tio Phil, nós vermelhinhos agradecemos.


3. A síndrome de Gilbert Arenas

Lembram-se quando o Arenas se machucou pela primeira vez (já não faz uns 15 anos que ele está sempre contundido?) e o Wizards, de repente, se tornou um time melhor? As explicações, dadas pelos próprios jogadores, eram duas. A primeira era que, sem sua maior arma ofensiva, o time precisava rodar mais a bola e todo mundo tinha que fazer sua parte. A segunda e mais bizarra era que, sem os pontos que Arenas sempre fazia, o time então tinha que se garantir na defesa e, portanto, apertou na marcação do perímetro. Por que eles não faziam isso ainda quando tinham o Arenas é uma pergunta sem resposta, mas acho que muitos times só fazem esse tipo de coisa quando a água bate na bunda.

A verdade é que sem Arenas o Wizards era um time mais frágil, menos confiante e muito limitado, o que a longo prazo ficou óbvio (eles fedem, afinal de contas). Mas a princípio sua saída foi benéfica em alguns aspectos. O mesmo acontece com esse Houston Rockets sem Yao Ming. Incapaz de fazer pontos no garrafão, o time agora roda a bola para conseguir encontrar espaço para arremessar de três pontos (com o chinês, isso era mais fácil porque sempre tinha um mané livre, malditas marcações duplas). Sem uma presença no garrafão, o time agora precisa se basear única e exclusivamente no pick-and-roll para conseguir se aproximar do aro. E, sem a defesa podendo afunilar o ataque adversário em direção do Yao (vai afunilar em direção do Hayes que tem 40 centímetros de altura?), a defesa do perímetro tem que apertar mais.

Arremessando mais de três pontos, aproveitando-se da defesa mais-ou-menos do Lakers, o Houston se coloca na posição de ter dias de mira calibrada e sair em vantagem. Usando o pick-and-roll sem parar, o Houston explora a maior (e mais famosa) deficiência defensiva do Lakers, incapaz de fazer coberturas (como tanto mostrou Chris Paul durante a temporada regular). E, por fim, apertando no perímetro, o Houston complica a vida de Kobe e permite que Gasol e Bynum tenham que decidir a partida lá dentro. Como pudemos ver ontem, "funhé!" para os dois homens de garrafão do Lakers.

A longo prazo, o Houston é pior, mais frágil e mais limitado. De fato, já o é, dependendo muito de bolas de três e de uma boa pitada de sorte. Mas é incrível como essas alterações que o Houston se viu obrigado a fazer casam perfeitamente com as fraquezas do Lakers. Não sei sei o técnico Rick Adelman teria mudado as coisas se Yao ainda estivesse podendo jogar, se foi puro acaso e obra da necessidade ou se foi uma série consecutiva de lances de gênio. Mas o Houston tem um transtorno bipolar positivo: aprendeu a jogar de quinhentas maneiras diferentes porque sempre tem alguma peça fundamental que pifou. Da maneira que está jogando agora, o Houston pode perder uma partida graças a um apagão do ataque no primeiro quarto, mas muitas coisas se encaixam e tornam uma vitória do Rockets nessa série uma real possibilidade. Talvez mais possível do que seria com Yao, ou do que seria para o Denver Nuggets. Será que o Nuggets pode colocar dois jogadores tão espetaculares em defesa no perímetro para encher o saquinho do Kobe Bryant, abusar dos pick-and-rolls, ter um jogador físico e nanico para obrigar o Gasol a arremessar? O Rockets deu sorte.


4. Os Zé-ninguém

Entrei em pânico, ao fim da temporada passada, com a possibilidade de que o Houston não renovasse o contrato de Carl Landry. Será que algum time lhe faria uma proposta muito alta? Fiquei rezando em silêncio para que nenhuma equipe da NBA tivesse percebido como ele é espetacular. O Bobcats percebeu e ofereceu 9 milhões de verdinhas por 3 anos. Acendi uma vela, pelamordedeus o Rockets precisa cobrir a proposta! Todo time precisa de um jogador produzido na máquina de fazer Jason Maxiells, que criou vários clones famosos como Paul Millsap, Leon Powe e Craig Smith. Só que o Landry, bizarramente, acerta arremessos da cabeça do garrafão.

O Houston cobriu a oferta, para minha felicidade, e aqui estão os resultados. Esse time já foi lento, pouco atlético e meio desanimado (provavelmente por causa daquele olho-meio-aberto do Tracy Mcgrady, meio "Amaral", que lhe dá aquela expressão de sono), mas com Scola, Battier e Landry, parece um bando de adolescentes naquele extinto programa que tinha a Tiazinha e a Feiticeira. Todo mundo corre, grita e se taca no chão como pino de boliche. Carl Landry enterra, pula pra burro, traz outra mentalidade pra equipe.

A mesma coisa acontece com Aaron Brooks. Rafer Alston era um armador burocrático, meio traumatizado com o estigma de ser "um armador da And1", só passava para o lado e tentava ser o herói dos jogos com arremessos inconsistentes de três pontos. Quando foi trocado por feijões mágicos, Aaron Brooks assumiu o barco assumidamente cercado por medo e receio. Seus arremessos também são inconsistentes e ele é um nanico, mas como aprendemos nas Ligas de Verão, Brooks é um pontuador nato. Rápido demais, bate para a cesta e ataca o aro. Com um pick-and-roll atrás do outro, invade o garrafão e dá pesadelos ao Lakers.

Com Yao em quadra, a bola vai para dentro do garrafão e depois para fora, obrigando Brooks a ser mais um arremessador. Sem Yao, Brooks não larga a bola e é obrigado a bater para dentro para evitar que a bola só fique no perímetro. Isso dá muito certo contra o Lakers, em especial. O armador lembra o Tony Parker em começo de carreira e não é sempre muito esperto, arremessa demais às vezes. Quando as coisas estão funcionando para ele, no entanto, o Houston é um time infinitamente melhor.


5. "Raça, manô!"

Culpa do Scola, culpa dos zé-ninguém, culpa da "síndrome de Gilbert Arenas", culpa do time ser tão bom jogando em casa, o Houston Rockets não sabe não estar empolgado numa partida. Jogam com uma energia inacreditável em cada posse de bola. Mais uma vez, isso se encaixa perfeitamente numa das fraquezas do Los Angeles Lakers: picados pela famosa mosca tsé-tsé, a mosca do sono, volta e meia a intensidade do Lakers simplesmente desaparece e eles cochilam em quadra.

Ontem, o Rockets ganhou na unha. Não foi na base da técnica do Scola ou dos arremessos certeiros do Aaron Brooks, foi na defesa mordida, nos pulos no chão para salvar bolas perdidas, no Artest atormentando o Kobe (que acabou, na frustração, empurrando o Artest que, por sua vez, saiu literalmente correndo da confusão, com medo de que ele espirrasse e fosse expulso - mas depois voltou para mostrar a língua quenem criança de 3 anos, "seu bobo, feioso!").




O Kobe estava puto, balançando a cabeça em reprovação, gritando com Pau Gasol no banco de reservas por tomar um pau do Scola, mas o resto do time estava querendo balançar numa rede e tomar uma caninha da boa.

Não acho que seja um problema de motivação, Phil Jackson sabe o que faz, creio apenas que seja como o time é, a junção coletiva de jogadores que não são tão intensos, que preferem a técnica, que desistem mais facilmente. Gasol, Odom, Bynum, Farmar, são todos jogadores sem muita confiança, um pouco temerosos, sem nunca saber exatamente se vão ser titulares ou não, se estão fazendo a coisa certa ou não. O espanhol, em particular, gosta do jogo técnico e não do jogo brigado. "Funhé!" pra ele, porque o Chuck Hayes nasceu para apenas três funções no mundo: abrir potes de picles, marcar o Nowitzki, e marcar o Pau Gasol.


É claro que, de certa forma, essa série chegar ao Jogo 7 é mérito do Houston Rockets, mas foi um pouco de sorte. Calhou do time ter aprendido, na raça, a jogar sem suas estrelas, de ter que modificar seu modo de jogar de uma partida para a outra. Calhou do Houston ter que explorar saídas que são, justamente (e talvez por puro acaso), pontos fracos do Lakers. E calhou, principalmente, do Lakers ser um time bipolar que não consegue manter a produção de um jogo para o outro, que sai mentalmente da partida facilmente, e que tem uma série enorme de fraquezas. Quantos séculos vão se passar até que esse time saiba defender um pick-and-roll? (se o Spurs tivesse o mesmo problema, teria sido destroçado pelo Suns ao invés de ter uma coleção de anéis em cada dedo).

comentamos aqui que essa temporada nos brindou com times favoritos muito, muito frágeis. Ninguém podia colocar o anel com antecedência simplesmente porque, quem acompanha o Lakers de perto, sabe que eles fedem um bocado às vezes, e quem acompanha o Cavs sabe como eles podem ser limitados no ataque quando são obrigados a jogar de forma mais lenta e cadenciada. Mérito do Houston por ter lutado bravamente e ter coroado esses playoffs com um Jogo 7 que, por si, já é uma vitória. Mas temos que ser realistas e apontar dedos: o Lakers é um time um tanto meia-boca para ser campeão. Pode vencer todo mundo, isso é verdade, mas pode tropeçar feio a qualquer segundo. O mesmo se aplica a todas as outras equipes que se mantém nos playoffs e não podemos apontar um favorito sequer, nem por um segundo. O Celtics está capenga, o Magic joga lideranças fora como se fosse o Silvio Santos tacando aviõezinhos no "Topa tudo por dinheiro".

Houston e Lakers se pegam no domingo, num imperdível Jogo 7. Abaixem as cabeças, crianças, porque será terra de ninguém. Qualquer um dos dois times pode ganhar por 40 pontos. Só que, se o Houston passar, não tem chances contra o Nuggets. Os cinco motivos acima não vão valer muito contra a equipe de Billups e Carmelo Anthony. Mas, desde já, sonho com mais um Jogo 7. Porque essa equipe me ensinou a fazer justamente isso, sonhar, acreditar, vibrar. Enquanto o Lakers, convenhamos, está ensinando outras coisas: ter medo, saber-se superior e mesmo assim fazer xixi na cama com o pavor de jogar tudo fora. Realidades muito diferentes que decidem tudo num jogo final. Preparem-se: vai ter chat do Bola Presa aqui, pra gente acompanhar ao vivo e se pegar no tapa. Não percam!

sexta-feira, 8 de maio de 2009

O basquete que ganha jogos

Nash mostra o que o basquete bonito fez com ele todos esses anos


Primeiro já deixo claro que não estou aqui pra falar do jogo do Cavs. Vamos falar do time do LeBron só quando eles enfrentarem um desafio de verdade, o que quer dizer que ficaremos mais algumas semanas sem mencioná-los. Essa série do Cavs com o Hawks já poderia ter acabado, deveriam usar uma variação da regra da Copa do Brasil de eliminar o jogo da volta. Somando os dois primeiros jogos, o Cavs está vencendo a série por 47 pontos, deveria ser o bastante.

Mas parei com o Cavs. Estou aqui para continuar a discussão do post de ontem do Danilo. Ele comentou o tal "basquete de playoff" e lamentou como os juízes levaram o jogo entre Lakers e Houston. O assunto rendeu muitos comentários então estou aqui para dar uma visão do lado vencedor do jogo, de modo que aqui todas as opiniões estão livres de qualquer sentimento imediato de derrota.

Primeiro eu acho deplorável que exista tal diferença de definição, não deveria existir o "basquete de temporada regular" e o "basquete de playoff" na NBA. É natural que o jogo seja mais disputado, mais tenso, com os jogadores se importando mais. Mas o jogo deve ser diferente para os jogadores, não para a arbitragem. Volta e meia tem comentarista gringo comentando que tal jogada teria sido falta na temporada regular mas que nos playoffs não é nada. Como assim? Falta é falta, o que não é falta não é falta.

Uma comparação que eu sempre faço na minha cabeça e que acho engraçada é que no futebol mundial é diferente. Os jogos da Copa do Mundo e da Champions League tem muito menos falta e é bem mais "leal" (não sei se é a palavra certa) do que a maioria mesmo sendo jogos de importância bem maior, os playoffs do futebol mundial. Em compensação, na América do Sul a Libertadores é dez vezes mais física que qualquer joguinho de playoff da NBA.

Na questão das faltas podemos fazer uma crítica geral, que engloba temporada regular e playoffs. O Danilo já fez um post comentando a vida dura dos pivôs que sofrem tanto com marcações de faltas, o Yao sofre com isso, o Dwight Howard, o Shaq e, no Lakers, o Bynum também. Tem jogo que eles simplesmente não conseguem jogar porque tudo o que fazem é falta, um dia depois fazem a mesma coisa e tá beleza, dominam o jogo. Parece escanteio no futebol, todo mundo se pega e tem dia que os juizes resolvem que um cara é o culpado e dão pênalti, ou que só o décimo quarto soco é que foi realmente falta.

Essa diferença de marcações dos juízes de um jogo para o outro e da temporada regular para os playoffs atrapalha bastante a vida dos jogadores, isso é fato, eu acho que demoraria para me adaptar a saber, de uma hora pra outra, o que pode e o que não pode fazer. Claramente o Bynum, por exemplo, não está conseguindo diferenciar o que é um jogo físico do que é fazer falta na visão dos juizes.

Essa diferenciação é idiota pra mim, mas nos EUA praticamente não achamos críticas sobre isso. Para eles é natural um empurrão ser falta na temporada regular e não ser nada nos playoffs, isso é consenso principalmente entre os ex-jogadores da liga que comentam jogos. O que é bem intimidante, convenhamos, quem sou eu pra discordar de caras que são jogadores de verdade e que estiveram lá jogando? Mas o dia em que eu entender, juro que concordo com eles.

Isso mostra como o jogo físico nos playoffs não só é aceito como é muito valorizado. É sempre dito por lá que times que jogam baseado em passes, velocidade e finesse são times de temporada regular, como o Suns do D'Antoni, o Mavs do Don Nelson e o Kings do Rick Adelman de 2002, 2003. Enquanto os times que são pura defesa, com jogo físico, são os que têm sucesso nos playoffs, como o Pistons de 2004, o Spurs dos últimos 10 anos e o atual campeão Boston Celtics.

A teoria ganhou ainda mais força nas finais da temporada passada quando o Celtics venceu o Lakers na final. O LA tinha um time que jogava com um ataque todo baseado em jogadores leves, rápidos e bom passadores, e o Celtics os anulou usando um basquete de força. E não vão entender que essa simplificação pareça que eu acho que o Celtics venceu só porque bateram no Lakers ou qualquer coisa assim.

Eu mesmo defendi que o Lakers deveria buscar jogadores mais físicos para conseguir competir com o Celtics e outros times parecidos nos playoffs para ser campeão (lembro que, num fórum, um torcedor do Lakers disse que faltavam uns "pretos ruins" pra fazer do Lakers campeão). Mas pra falar a verdade essa é a minha opinião de torcedor do Lakers, que quer ver o time ser campeão usando qualquer esquema de jogo. Como simples amante do basquete eu queria que o Lakers ganhasse com o time que joga mas bonito (que por sinal é o que tem o Odom no lugar do Bynum).

Mas fica aquela coisa, o Kings de 2002 tinha um dos basquetes mais bonitos de todos os tempos e perdeu do Lakers que tinha forte defesa, jogadores nada simpáticos com os adversários (Shaq, Kobe, Horry e a doçura do Rick Fox, por exemplo). O Suns e o Dallas, com um jogo de pura velocidade, eram presas fáceis para o Spurs. O Mavs só venceu o Spurs quando o Avery Johnson chegou lá implementando defesa forte, ataque de meia quadra e usando brucutus do nível de Erick Dampier e DeSagana Diop.

Como torcedor você acaba querendo o time mais físico porque historicamente é o que dá mais resultado e não quer torcer pra time de temporada regular.

Já sei que uns vão dizer que time que joga bonito é time que ganha. Mas isso pra mim é palhaçada, esse argumento só vale pra torcedor. Eu aceito ver o Corinthians ganhar com uma defesa forte e violenta e com 1 a 0 gol de sorte. Mas se o Once Caldas faz isso eu acho um porre.
Se o Lakers vence jogando como o Spurs eu acho legal, ver o Spurs jogar aquele joguinho deles trocentas vezes não é legal.

Mas será que tem um jeito de ser campeão da NBA sem se entregar à essa regra de time defensivo com alguma variação do Kendrick Perkins no garrafão? Qual é o limite do jogo físico, quando ele se torna desleal? Ele deveria ser aceito na temporada regular ou os playoffs é que deveriam ter arbitragem mais firme? Mais assuntos para a sessão "Kobe ou LeBron?" de discussões infinitas.